quinta-feira, 20 de outubro de 2011

NOTICIA PUBLICADA NO JORNAL ZERO HORA de 16 DE OUTUBRO DE 2011


UM MISTÉRIO LACRADO HÁ TRÊS DÉCADAS (Capa com foto e páginas 23 a 26) Construído em meados da década de 1960, um galpão, com 150 metros quadrados e oito metros de altura, no quartel da Escola de Bombeiros, no bairro Santa Cecília, em Porto Alegre, guarda um segredo que agitou o país no século passado. Telhado de amianto despencando, janelas com vidros quebrados e paredes com a tinta descascada, rodeadas de mato e carcaças de viaturas, o local é fonte de proliferação de ratos e insetos. Um lacre soldado à porta enferrujada impede o acesso há três décadas e reforça os contornos do mistério. A “descoberta do prédio secreto” aconteceu há quatro meses, quando a Brigada Militar começou reformas no quartel para abrigar a sede do comando dos bombeiros. Mas o segredo é tamanho que nem a BM teve acesso. Pleiteia na Justiça autorização para entrar no prédio da corporação. Fechado por ordem do Palácio Piratini em nome da “segurança nacional”, o pavilhão era a oficina II do Centro de Suprimentos de Motomecanização da BM, onde eram pintados os carros dos bombeiros. Por quase dois anos, o local serviu como laboratório para uma experiência sigilosa do governo sob os olhares vigilantes do extinto Serviço Nacional de Informações (SNI): a invenção de um reator alimentado por água e álcool (em proporções iguais) que fazia mover carros, caminhões, ônibus, tratores e motores em geral, desenvolvida pelo engenheiro mecânico francês Jean Pierre Marie Chambrin. Lacrada desde dezembro de 1982, a oficina foi cenário de um enredo recheado de mistérios e cuja pretensão era mudar os rumos da indústria petrolífera mundial e consagrar o uso de etanol. A experiência que revolucionaria o mercado de combustíveis e valeria, hoje, R$ 19,4 milhões, conforme calculava Chambrin, não prosperou. Permeada por interesses nem sempre claros, encobertos por suspeitas de sabotagem, boicote, furto e desconfiança, virou uma batalha nos tribunais que só teve derrotados. Levando em conta valores pagos para patentear a invenção de Chambrin, o Estado perdeu R$ 523 mil e foi condenado a pagar R$ 3,6 mil em honorários advocatícios. Teve gastos com mão de obra dos mecânicos auxiliares de Chambrin, materiais de trabalho, com o sucateamento de três caminhões e de um carro e a impossibilidade de usar a oficina. Capítulos desta história estão no Arquivo do Tribunal de Justiça e no livro Dossiê Chambrin – A Saga do Motor Água e Álcool, do empresário alagoano Jarbas Oiticica. Ao ter acesso aos documentos, ZH revela parte dos mistérios do Projeto Chambrin. Outros, jamais serão conhecidos. “É uma questão complexa, de macroeconomia, no campo científico e tecnológico, envolvendo interesse nacional. Por causa disso, tenho limites para falar”, esquiva-se o arquiteto gaúcho Waldir José Maggi, 79 anos, sócio de Chambrin. O engenheiro francês manteve seus segredos em sigilo e os levou para o túmulo, há 22 anos. PORTO ALEGRE
A HISTÓRIA DO CARRO MOVIDO A ÁGUA (Página 24) Aos 51 anos, em maio de 1976, o engenheiro francês Jean Pierre Marie Chambrin fechou sua oficina de assistência técnica para a montadora Citröen, em Rouen, na Normandia, para desenvolver sua invenção em Alagoas. No ano anterior, tinha criado o Reator Chambrin, um mecanismo automotivo que aproveitava gases quentes do escapamento para aquecer o combustível, álcool e água, isolar o hidrogênio e aproveitá-lo como fonte de energia para motores. Na França, Chambrin gozava de elevado conceito no meio científico com prêmios e a distinção de “engenheiro expert em mecânica”. Chambrin chegou ao Brasil pelas mãos do empresário Jarbas Oiticica, diretor da Estação Experimental de cana de açúcar de Maceió, que planejava aproveitar os conhecimentos do francês para impulsionar o álcool alagoano no mercado brasileiro. A bordo de um Corcel, o invento de Chambrin foi testado com sucesso no Parque de Motomecanização do Exército, em Recife (PE), viajou para o centro do país e Brasília, despertando atenção até do general Ernesto Geisel, então presidente da República (1974 a 1979), que já tinha dirigido a Petrobras. Em abril de 1977, a Empresa Brasileira de Transportes Urbanos (EBTU) se interessou pelo reator para equipar a frota de ônibus nas grandes cidades, e um contrato de prestação de serviços por quatro meses foi assinado. Chambrin recebeu R$ 13 mil de salário, diária de R$ 473 (valores corrigidos) e um carro para uso pessoal. A EBTU avaliaria o desempenho de um ônibus-protótipo, mas nunca mandou um ônibus para Maceió. Chambrin adaptou o reator em um caminhão emprestado por Oiticica. Em maio de 1978, dois técnicos da EBTU rodaram com o veículo, mas o teste não foi conclusivo. Alegaram desconhecer o funcionamento completo do reator, e Chambrin se negava a revelar o segredo.
“A OPEP PAGARIA PARA FICAR NO PAPEL” (Página 26) O coronel da reserva Milton Weyrich, 74 anos, era comandante-geral da BM entre 1981 e 1982, quando foi desenvolvido o projeto Chambrin em um quartel. O oficial acompanhava a experiência do seu gabinete e, pelas informações que recebia, se convenceu de que a invenção causaria uma revolução mundial, caso fosse concluída com sucesso: Zero Hora – Como o senhor teve conhecimento do projeto? Milton Weyrich – O assunto foi levado ao governador Amaral de Souza, e ele mandou conversar comigo. Designei o centro de manutenção do Corpo de Bombeiros. ZH – O senhor acompanhava a experiência? Weyrich – Começaram a viajar pelo Interior. Meu pessoal dizia que estava funcionando, cada vez mais com menos combustível e mais água. Se desse certo, criaria um problema econômico tremendo. Seria um desastre. Iam pagar para não comercializar. ZH – Quem pagaria para o projeto ficar no papel? Weyrich – A Opep (Organização dos Países Exportadores de Petróleo) pagaria e sei lá quem. ZH – O senhor acha que o invento causaria um problema mundial? Weyrich – Acho. Se realmente funcionasse, causaria uma desestabilização econômica. O petróleo, há mais de 60, 70, 80 anos, move o mundo. ZH – A Opep pagaria e assumiria a patente para não ser usada? Weyrich – Acho que sim. O mundo ainda não estava preparado para isso. Havia um investimento, como ainda há hoje, um investimento enorme. Nós estamos investindo no pré-sal, que vai sair caríssimo. ZH – O senhor lembra o que resultou no fechamento da oficina? Weyrich – Não me recordo disso. O interesse que a gente tinha é que desse certo. Havia até a promessa de que a BM teria uma participação financeiramente desse invento. ZH – Não prosperou por alguma tentativa de boicote? Weyrich – Acho que não. Todos estavam torcendo. Se desse 100% certo, ia ser um cataclismo financeiro. ZH – A experiência era tratada com sigilo dentro da BM? Weyrich – Sim. Não havia por que alardear uma coisa de valor estratégico. Por isso foi solicitado que a BM abrigasse esse experimento, é uma corporação reservada.
                 

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